SUBPROJETO:
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SUBPROJETO GUAIAMUM - BIOECOLOGIA E ETNOCONHECIMENTO PARA A CONSERVAÇÃO

O Subprojeto Guaiamum – Bioecologia e Etnoconhecimento para a Conservação, proposto e executado, de 2021 à 2023, pela Fundação Educacional Ciência e Desenvolvimento (FECD), em parceria com a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) tem como objetivo principal fortalecer, com base no diálogo entre os conhecimentos tradicional e acadêmico, o Plano de Gestão Local (PGL) da pesca artesanal do caranguejo guaimum (Cardisoma guanhumi), no estuário da Área de Proteção Ambiental (APA) da Bacia do Rio São João/Mico-Leão-Dourado, bem como estudar essa espécie no Parque Natural (PARNA) Municipal do Mico-Leão-Dourado, estado do Rio de Janeiro.

Pretende-se seguir os pressupostos estabelecidos pela legislação vigente, para que se retire da ilegalidade os profissionais envolvidos na captura do guaiamum na área da APA, garantindo a conservação da espécie e permitindo que esses pescadores possam trabalhar de forma digna, organizada, sustentável e legal.

Por que fazer?

A proposta desse Subprojeto surgiu da necessidade de responder a algumas questões levantadas pelos catadores de guaiamum do estuário do Rio São João (que está nos limites da APA), e gerar um conjunto de dados para subsidiar a análise e as contribuições para o plano de gestão local (PGL) da atividade pesqueira da espécie, classificada como criticamente em perigo (CR) no Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção: Volume VII – Invertebrados (ICMBio/MMA, 2018).

O Parque Natural Municipal do Mico-Leão-Dourado foi criado em 1997 e é área contígua à Área de Proteção Ambiental (APA) da Bacia do Rio São João, criada em 2002, localizada na parte central costeira do estado do Rio de Janeiro, cujo Plano de Manejo foi elaborado em 2008. Entre os objetivos do Plano destacam-se: proteger as populações e espécies ameaçadas, a biodiversidade e os recursos pesqueiros; apoiar e estimular estudos e pesquisas científicas voltados para melhor conhecimento dos recursos naturais e culturais; valorizar a cultura local das comunidades inseridas na região da APA e assegurar a manutenção da viabilidade genética de fauna e flora. Um dos recursos pesqueiros que se destaca na região é o caranguejo guaiamum (Cardisoma guanhumi).

A Portaria MMA 4455 tornou o guaiamum protegido de forma integral, proibindo sua captura, transporte, manejo e comercialização, deixando em situação de ilegalidade e fragilidade social os catadores que sobrevivem da extração desse recurso. A Portaria Interministerial 38 de 26 de julho de 2018 trouxe o Plano de Gestão Local (PGL) da atividade pesqueira do guaiamum, uma possibilidade de solução desse impasse entre ações voltadas para preservação dos estoques do guaiamum e as necessidades de sustento de comunidades tradicionais que utilizam esse recurso, mesmo que de forma ilegal. Neste sentido, esse documento estabelece as diretrizes e recomendações para a conservação e recuperação do guaiamum em áreas de unidades de conservação de uso sustentável ou áreas manejadas.

Atualmente, o guaiamum distribui-se por uma área que tem como limite norte o estado americano da Flórida (EUA) e, ao sul, o estado de Santa Catarina (Brasil). É o maior caranguejo semiterrestre da costa brasileira e possui maior quantidade de carne do que outras espécies, atingindo maiores valores em sua venda. A área habitada por ele depende do seu estágio de desenvolvimento e da amplitude de maré na região. O guaiamum pode viver nas partes menos alagáveis do manguezal, bem como nas alagáveis, havendo também registros de ocorrência em restingas. A espécie necessita de cobertura vegetal com sombreamento, fornecendo alimento e umidade.

O guaiamum recolhe folhas e frutas para suas tocas durante a alimentação, promovendo, assim, a retenção de nutrientes no solo e aumentando a produtividade desses ambientes. Por ser escavador, promove aeração do solo e contribui para o aumento da absorção de água. É um caranguejo de crescimento lento, podendo viver até 13 anos e realizar 60 mudas de carapaça ao longo de sua vida.

O fato de habitar áreas litorâneas, valorizadas para a construção de moradias e de infraestrutura turística, juntamente com a exploração excessiva de seus estoques, colocam essa espécie em situação crítica. Apesar de sua importância, a maioria dos estudos realizados com esse caranguejo estão concentrados nas regiões Norte e Nordeste, onde sua captura se dá de forma mais intensa.

Estudos sobre a bioecologia da espécie, incluindo aspectos como densidades e distribuição populacional, habitats preferenciais, dinâmica reprodutiva, andadas de acasalamento e desova, dispersão e assentamento larval, dentre outros, são essenciais na elaboração de planos de manejo e conservação. Faz-se urgente o estudo dos estoques do guaiamum no Sudeste, em especial na região do Rio São João.

Nesse sentido, este Subprojeto pretende estudar o guaiamum, tanto em uma unidade de conservação de uso sustentável (APA), como em uma de proteção integral (PARNA). Existem indícios de que, no estado do Rio de Janeiro, essa seja umas das áreas onde a espécie é mais abundante. Hoje em dia, a avaliação dos estoques pesqueiros não é feita somente com a utilização de técnicas tradicionais, como o acompanhamento de desembarque pesqueiro, mas também por meio de novas técnicas moleculares.

A identificação dos estoques de invertebrados marinhos utilizando a genética pesqueira é bastante eficaz, ajudando a delimitar populações e esclarecer sua conectividade. Diversas técnicas moleculares têm sido utilizadas no estudo de organismos marinhos em diferentes países. No Brasil, estudos de genética pesqueira já foram utilizados com sucesso na identificação de espécies novas e delimitação dos estoques de vários crustáceos.

Além dos levantamentos relacionados à bioecologia do guaiamum e os dados obtidos com o monitoramento dessa espécie, pretende-se incorporar o conhecimento ecológico local, ou seja, a interpretação das populações humanas e informações acumuladas pela relação de uso e dependência estabelecida com os recursos naturais. É fundamental agregar estudos da etnobiologia, ou seja, sobre o conhecimento e os conceitos desenvolvidos pela sociedade a respeito da biologia e etnoecologia, o estudo sobre como as populações humanas interpretam as conexões oriundas das interações entre a sociedade e a natureza.

Considerando que o conhecimento tradicional traz informações relevantes para a sustentabilidade ecológica e econômica, além de estabelecer a prática produtiva dos pescadores artesanais, a análise do Plano de Gestão Local da pesca artesanal do guaiamum na APA e as contribuições que se fizerem necessárias serão realizadas com a participação dos pescadores artesanais, tendo como base o diálogo entre conhecimentos acadêmico e tradicional.

Por essa, e por todas as questões aqui descritas, se faz importante o estudo dessa espécie sob a ótica, não só da conservação de sua diversidade genética, mas, também, sob um olhar de preservação dos estoques pesqueiros, com seu uso consciente e organizado. Tudo isso em consonância com o Plano de Ação para conservação das espécies ameaçadas e de importância socioeconômica do ecossistema manguezal (PAN Manguezal).

O público beneficiado ou afetado pelo Subprojeto é composto por:

· Catadores de guaiamum e suas famílias;

· Populações residentes na APA da Bacia do Rio São João/Mico-Leão-Dourado e do entorno;

· Populações residentes no entorno do Parque Natural Municipal do Mico-Leão-Dourado;

· Chefes e conselhos gestores das unidades de conservação;

· Entidades representativas da pesca artesanal (colônias e associações de pescadores artesanais);

· Secretarias Municipais de Meio Ambiente de Casimiro de Abreu e Cabo Frio.

Como está sendo realizado?

As atividades desenvolvidas no Subprojeto estão relacionadas aos seus objetivos específicos. Para tanto, a equipe vem identificando áreas de ocorrência do guaiamum e seus principais locais de captura. Pretende-se realizar amplo levantamento de informações acerca da biodiversidade genômica, biologia reprodutiva e populacional, bioecologia da espécie, monitorar os parâmetros físico-químicos da água do rio São João e avaliar contaminação por metal traço nos sedimentos e caranguejos.

Além de colaborar em campo, os catadores de caranguejo irão, por meio de metodologias participativas, caracterizar a pesca artesanal local, mapear áreas de pesca e de exclusão, caracterizar os conflitos, analisar e contribuir com o PGL. O etnoconhecimento acerca da biologia, ecologia e manejo da espécie será identificado. Tais dados serão cruzados com a bibliografia e os resultados obtidos no primeiro ano de implementação, de forma a revelar as semelhanças e principalmente, as discrepâncias entre os conhecimentos tradicional e acadêmico. O resultado desse cruzamento de informações irá amparar a análise coletiva e eventual proposição de melhorias ao PGL.

O monitoramento das capturas é uma das ferramentas fundamentais para subvencionar informações para o manejo da espécie. Além do legado de todo o conhecimento gerado no Subprojeto, o monitoramento será uma atividade que terá continuidade, tornando-se um hábito na comunidade e fornecendo informações continuadas aos gestores da Unidade.

Uma das formas utilizadas para isso será a capacitação e estímulo à utilização do aplicativo REMAR Cidadão8 que vem obtendo, ao longo dos anos, respostas importantes nas regiões Norte e Nordeste no que diz respeito às andadas reprodutivas dos caranguejos uçá e guaiamum.

O aplicativo será incorporado ao Subprojeto e utilizado de forma sistemática pela primeira vez na região Sudeste-Sul, fornecendo dados importantes para a comparação de andadas nas diferentes regiões do Brasil. A utilização desse dado pela população que vive no entorno do rio São João será mais uma atividade que a comunidade poderá dar continuidade após o término do Subprojeto.

A metodologia participativa adotada será a do Diagnóstico Rápido Participativo (DRP), de forma a valorizar o conhecimento e a capacidade analítica dos comunitários. As informações coletadas serão norteadas por um roteiro elaborado previamente e serão utilizadas técnicas facilitadoras de diálogos.

A caracterização da pesca artesanal de guaiamum abrangerá os aspectos socioculturais e a territorialidade da pesca artesanal, incluindo a organização comunitária, social e pluriatividade de pescadores. Tanto essa caracterização como a identificação dos conflitos e usos da área se darão a partir do cruzamento dos dados coletados em campo com a pesquisa bibliográfica, gerando um documento final. O mapeamento de territórios de pesca artesanal contendo as áreas de exclusão de pesca será realizado de forma participativa com a aplicação em grupo da ferramenta de diálogo chamada “mapa falado”.

Ao final do primeiro ano será realizada uma devolutiva para a comunidade com a apresentação dos resultados da caracterização realizada. Tal devolutiva ocorrerá no formato de reunião com a participação de pescadores, atores sociais, lideranças locais, instituições e equipe do Subprojeto.

Principais resultados esperados:

Pretende-se que ao final dos 24 meses de implementação desse Subprojeto, as informações obtidas junto às comunidades tradicionais, associadas ao levantamento bibliográfico e ao conhecimento científico gerado, componham um conjunto de dados para embasar a análise e eventuais contribuições ao PGL. Além disso, pretende-se que as estratégias metodológicas desenvolvidas na presente proposta, sejam utilizadas em outras UCs e manguezais brasileiros.

Conheça outros resultados esperados com a realização do Subprojeto:

· Caracterização da pesca artesanal de guaiamum na APA da Bacia do Rio São João/Mico-Leão-Dourado;

· Mapeamento participativo dos territórios da pesca artesanal e identificação das áreas de exclusão de pesca, incluindo a caracterização dos usos e conflitos da pesca artesanal;

· Avaliação da qualidade das águas do rio São João;

· Determinação das quantidades de metal pesado no sedimento e de metais em material biológico;

· Determinação do tamanho da primeira maturação em fêmeas de guaiamum e da relação macho/fêmea;

· Determinação da curva de crescimento e estimativa da longevidade, das taxas de mortalidade e de exploração;

· Delimitação do período reprodutivo;

· Caracterização do período de andada;

· Relatório dos resultados da análise das fêmeas com ovas e do comportamento de desova e abundância larval;

· Mapas da distribuição dos locais de assentamento e recrutamento de guaiamum e análise das influências identificadas que atuam sobre eles;

· Caracterização e delimitação genética dos estoques pesqueiros;

· Pesquisa da ocorrência do fungo causador da “Doença do Caranguejo Letárgico9”;

· Relatório sobre as áreas onde a espécie ocorre e é explorada nas duas Unidades de Conservação;

· Relatório com indicação das áreas de ocorrência, incluindo análise da distribuição em diferentes substratos e vegetações;

· Relatório com o perfil da pesca do guaiamum na região da APA, abordando assuntos como volume pescado total, áreas de maior captura, esforço de pesca, variação das áreas de captura ao longo do ano;

· Documento final contendo a estatística básica e análise do conhecimento tradicional acerca da biologia, ecologia e manejo do guaiamum;

· Documento final contendo as similaridades e disparidades entre os conhecimentos tradicional e acadêmico acerca da biologia, ecologia e manejo do guaiamum;

· Análise do Plano de Gestão Local da atividade pesqueira do guaiamum e, se pertinente, propostas de adequações.