SUBPROJETO:
multisar

SUBPROJETO MULTISAR: UMA ABORDAGEM MULTIDISCIPLINAR SOBRE A SARDINHA-VERDADEIRA (SARDINELLA BRASILIENSIS)

O Subprojeto Multisar: uma Abordagem Multidisciplinar sobre a Sardinha-Verdadeira (Sardinella brasiliensis), foi desenvolvido entre setembro de 2016 e setembro de 2019, pela Fundação de Apoio à Universidade do Rio Grande (FAURG), objetivando conhecer a distribuição e a estimativa de abundância em áreas de concentração de cardumes da espécie.

O Multisar foi desenvolvido em parceria com o Subprojeto PetroSardinha (Subprojeto Bioacumulação e Exposição a Hidrocarbonetos Petrogênicos e Contaminantes Orgânicos em Pescado: Estudo de Caso da Sardinha-Verdadeira (Sardinella brasiliensis) no estado do Rio de Janeiro)1, subsidiando este último com os dados coletados no cruzeiro de pesquisa

Por que fazer?

A Sardinha-verdadeira (Sardinella brasiliensis) representa o maior estoque pesqueiro explorado do Brasil e sustenta um importante segmento de pesca com frotas sediadas nos estados do Rio de Janeiro, São Paulo e Santa Catarina.

Devido às características de seu ciclo de vida, a abundância da sardinha-verdadeira sofre influência direta das variações ambientais. Essa particularidade, associada ao intenso esforço de pesca e a limites no processo de gestão do uso sustentável da espécie, ocasionou uma crise de diminuição do estoque, com importante reflexos sociais e econômicos.

Preocupado com a situação, o estado buscou alternativas e caminhos para reverter esse quadro, como também assessorar o IBAMA na tomada de decisão, instituindo através da Portaria IBAMA nº 04, de 14 de janeiro de 2005, o Comitê de Gestão do Uso Sustentável de Sardinha-Verdadeira (CGSS).

O CGSS tem como princípio básico a implementação de um processo de gestão compartilhada de responsabilidades e por meio do seu Subcomitê Científico, elaborou um Plano de Gestão para o Uso Sustentável da Sardinha-verdadeira, o qual contemplou e priorizou aspectos e atividades urgentes, além das ações para médio e longo prazos.

A estruturação do Plano de Gestão seguiu o modelo proposto pela FAO, divido em duas partes principais: Diagnóstico do Recurso e Plano para Recuperação e Manutenção do Uso Sustentável do Estoque da Sardinha-verdadeira.

O sucesso do Plano de Gestão da sardinha-verdadeira depende de um constante monitoramento e geração de novas informações científicas, mantendo-se assim um panorama atualizado que permite avaliar a saúde do estoque e definir estratégias de manejo. A utilização de metodologias

de estudo atuais, como as análises moleculares, representa um importante aporte de novas informações.

Estimar o tamanho atual do estoque, a taxa de exploração e a produtividade potencial são atividades fundamentais neste processo. O objetivo principal da estimativa é providenciar aconselhamento técnico para manter a produtividade pesqueira, recuperar o estoque e manejar a pesca de forma a dispor de capturas próximas da máxima sustentável.

Como foi realizado?

A pesquisa foi realizada durante o período de safra da pesca comercial da espécie, utilizando um navio de pesquisa e uma traineira de pesca, simultaneamente, em área de concentração de cardumes de sardinha-verdadeira. Nos cruzeiros, eram coletados dados hidroacústicos6, biológicos (peixes e zooplâncton) e ambientais, os quais foram analisados sobre os pontos de vista dos diferentes objetivos específicos.

Os cruzeiros de pesquisa a bordo do navio pesqueiro Atlântico Sul e da traineira de pesca Victoria Mar ocorreram de forma simultânea, com o embarque da equipe de pesquisadores do Subprojeto Multisar em Itajaí (SC) com início em 22 de março e final em 02 de abril de 2018, com desembarque em Rio Grande (RS).

Foram realizadas identificações da estrutura populacional, a estimativa de taxas de migração da espécie e a estimativa do tamanho efetivo do estoque.

Foram realizados estudos sobre alimentação e ecologia trófica, parasitologia, toxicologia, estrutura populacional por métodos de análises moleculares, correlações com a comunidade zooplanctônica e com condições oceanográficas na área, a fim de aumentar o entendimento sobre os fatores que determinam a ocorrência de concentrações de cardumes de sardinha-verdadeira.

Tais estudos incluíram a realização de amostragem biológica e biometria de peixes coletados nos lances de arrasto, coleta de amostras representativas da sardinha-verdadeira e de espécies similares em diferentes lances de pesca em cruzeiros de pesquisa, obtenção de dados biométricos e amostragem biológica dos exemplares, incluindo coleta de estômagos, de músculos e de suas principais presas (encontradas no conteúdo alimentar) não digeridas, análises dos conteúdos estomacais e descrição da dieta, análise das concentrações de mercúrio, metil mercúrio e metais nas diferentes classes de tamanho.

A partir do estudo dessas concentrações foi realizado o cálculo das taxas de ingestão de metais, hábito alimentar da população e limites propostos para ingestão humana pela literatura, visando avaliar as fontes de exposição.

Principais resultados:

· Realização de cruzeiros para coleta de dados e amostras. A viagem de 10 dias, percorreu quase mil milhas náuticas (o que equivale a quase 2 mil km). Com a viagem, foram coletados dados sobre a temperatura, salinidade e fluorescência da água, organismos zooplanctônicos e avaliação de matéria orgânica, usados para gerar um mapa de distribuição e estimativa de abundância de sardinha-verdadeira em área de concentração de cardume.

· Compreensão da ecologia trófica da sardinha-verdadeira no sudeste-sul do Brasil. Através de uma abordagem multidisciplinar e com técnicas recentes, foi possível gerar informações importantes sobre o papel dessa espécie em relação ao ecossistema e suas relações com outros organismos.

· Os resultados encontrados podem ser utilizados como base para evidenciar mudanças ecossistêmicas na dieta, nas relações tróficas, nos nichos tróficos, além de alterações nos fluxos de energia, e, até mesmo, nas respostas dos organismos aos efeitos da pesca e mudanças climáticas.

· A análise espacial das concentrações dos elementos nas sardinhas indicou uma ampla variação entre os locais de coleta, com todas as localidades apresentando valores superiores para algum elemento. Porém, as sardinhas coletadas na região de Niterói, Arraial do Cabo e a norte de Rio Grande tiveram o maior número de contaminantes detectados na biomassa dos peixes, respectivamente.

· A sardinha-verdadeira coletada na costa sul e sudeste do Brasil pode ser considerada uma importante fonte nutricional de Manganês (Mn), Cromo (Cr) Potássio (K), Fósforo (P), Cobre (Cu) e Cálcio (Ca), sendo as sardinhas coletadas em Macaé as mais nutritivas entre as áreas amostradas.

· O cálculo do Índice de Poluição por Metais indicou a maior poluição total por metais na sardinha-verdadeira coletada em Arraial do Cabo, no cruzeiro próximo a Rio Grande e Niterói.

· A relação entre a biometria (peso e comprimento) e as concentrações dos elementos analisados da sardinha-verdadeira indicaram que para elementos como Ferro (Fe), Manganês (Mn), Estrôncio (Sr), Cobre (Cu), Bário (Ba), Cálcio (Ca) e Sódio (Na) houve uma relação inversa entre as variáveis, indicando uma diluição das concentrações em peixes com biomassa maior, sendo os peixes menores mais nutritivos no caso dos elementos essenciais. Para Mercúrio (Hg) e Arsênio (As) foi observado uma relação direta entre as variáveis, indicando um aumento das concentrações dos poluentes nos peixes maiores, sugerindo um processo de bioacumulação dos contaminantes.

· A análise de risco, representada pelos índices de Ingestão Diária Estimada (de elementos), Consumo Máximo Seguro (de sardinhas) e Coeficiente de Dano, indicou que a sardinha-verdadeira pode ser consumida de forma segura para todos elementos analisados, com alguma ressalva para Zinco (Zn), Cádmio (Cd), Chumbo (Pb), Arsênio (As) e Cromo (Cr) que apresentaram algumas violações das concentrações quando comparados com os valores máximos preconizados pela ANVISA, e para Mercúrio (Hg), Arsênio (As) e Chumbo (Pb) devido às menores quantidades de peixes (140 a 500 g) que, se consumidas diariamente, podem causar efeitos tóxicos em um adulto.

· A densidade total do zooplâncton e do holoplâncton14 não variaram de maneira significativa entre as isóbatas15 e entre as porções norte e sul no atual estudo. Os dados obtidos neste estudo, não revelaram um típico padrão horizontal de distribuição de densidade do zooplâncton, que tende a apresentar maiores valores significativos em regiões mais próximas à costa, devido ao aumento de nutrientes e produtores primários (fitoplâncton), que servem de alimento para esses organismos.

· Ao contrário do observado para o holoplâncton, o meroplâncton16 variou de maneira significativa entre as isóbatas e entre as regiões norte e sul neste estudo. A ocorrência e a variação dos organismos meroplanctônicos, estão associadas aos períodos reprodutivos e à dispersão dos organismos bentônicos adultos, tendendo a aumentar a sua abundância em ambientes costeiros rasos, que permitem a fixação desses organismos, o que foi observado no atual estudo.

· Caracterização da comunidade zooplanctônica e ambiente da área de estudo durante o cruzeiro oceanográfico. O número alto de  do zooplâncton encontrados neste estudo é típico de um ambiente de plataforma continental da região tropical. O maior número de espécies registradas foi da subclasse Copepoda. Esse grupo é o melhor representado em termos de riqueza de espécies em todos os ambientes aquáticos, sendo os organismos com maior diversidade em ambiente marinho em regiões costeiras e oceânicas. Entre os copépodas, as espécies mais abundantes foram as espécies filtradoras (Temora stylifera e Clausocalanus furcatus) e detritivoras (Oncaea venusta e Triconia cf. conifera), que representaram 64% do total do zooplâncton coletado. Além destas espécies, foi registrada a ocorrência de espécies costeiras como Centropages velificatus e Hemicyclops thalassius em maior abundância em estações próximas a costa e ao canal da lagoa dos Patos.

· A associação das informações geradas pelos dois Subprojetos – Multisar e PetroSardinha – contribuiu para o uso sustentável dos recursos, ao avançar na compreensão dos fatores antrópicos sobre a qualidade e a saúde da sardinha-verdadeira e as potenciais interações da ação antrópica com fatores naturais e ecológicos determinantes da dinâmica populacional dessa espécie.

galeria de fotos